Diretrizes sobre combate a lavagem de dinheiro e ao financiamento terrorista no mercado de artes – Versão 2023.1

1.   Contexto

Estas diretrizes destinam-se a todo agente que opera no mercado de arte e visam facilitar as transações responsáveis de obras de arte no mercado com o uso de boas práticas de todos os participantes do mercado 2.

As empresas que operam no mercado de arte devem adotar medidas que evitem e combatam a lavagem de dinheiro, sujeitando-se às leis, ao perfil do seu negócio, ao risco de seus clientes e das obras que trabalham.

As diretrizes são mais relevantes para empresas que estão envolvidas na transação comercial de obras de arte, incluindo comerciantes, galeristas, leiloeiros, consultores, corretores, intermediários e outros profissionais que assessoram clientes em transações. Para empresas que prestam serviços complementares (transporte, armazenamento, seguro, inspeção, restauro, etc.) as medidas tratadas nas diretrizes buscam aprimoramento e boas práticas, demonstrando o cuidado e não incentivo/leniência com lavagem de dinheiro e financiamento terrorista.

2.   Conceitos

Lavagem de dinheiro é o procedimento pelo qual os rendimentos das atividades do crime (tráfico de seres humanos, prostituição forçada, tráfico de drogas, extorsão, corrupção, crimes de colarinho branco, assaltos, roubos, etc.) são introduzidos na economia legítima para disfarçar sua origem ilícita a fim de evitar que sejam confiscados pelas autoridades. Tais operações incluem transações em moedas, com artigos de luxo e peças de arte. Os agentes dessa prática ficam no anonimato e buscam enganar para disfarçar a origem dos recursos e ocultar o verdadeiro objetivo de seus negócios e transações. Qualquer agente envolvido em transações de lavagem de dinheiro pode ser acusado de cometer um crime.

O financiamento do terrorismo refere-se a atividades que fornecem recursos ou apoio financeiro a atividades terroristas. Mesmo que os recursos tenham origem legitima, a finalidade do seu uso é ilícita. São utilizadas estratégias, esquemas e operações secretas semelhantes às de lavagem de dinheiro. 

A lavagem e o financiamento do terrorismo não podem ser realizadas sem a participação conivente de intermediários profissionais ou pessoas despreparadas que desconhecem ou não querem ter conhecimento da origem e/ou destino do dinheiro e dos ativos que tem sob gestão.

A lavagem de dinheiro normalmente possui 3 fases: ocultação, dissimulação e reintegração (podendo ocorrer simultaneamente): (i) A ocultação (também chamada colocação) é o processo em que os lavadores de dinheiro introduzem lucros ilegais no sistema financeiro, normalmente feito dividindo grandes quantidades de dinheiro em somas menores (menos evidentes) depositadas em várias contas bancárias. O objetivo é o distanciamento do dinheiro obtido ilegalmente da fonte origem para evitar a detecção da atividade criminosa e tornar os fundos mais líquidos pois permitem que sejam transformados em outros ativos financeiros (cheques, ordens de pagamento, etc.); (ii) A dissimulação (também chamada cobertura, acumulação, estratificação ou camuflagem) é o processo de ocultar a fonte ilícita e a propriedade dos recursos através de um sistema complexo de transações para criar múltiplas camadas entre a fonte ilícita e os fundos. Após os recursos serem introduzidos no sistema financeiro (fase ocultação) há múltiplas transações e transferências complexas para disfarçar e confundir auditorias e atrapalhar investigações criminais (exemplos são usar vários bancos e contas; utilizar intermediários profissionais para realizar transações; converter dinheiro em ordens de pagamento, cartas de crédito, transferências bancárias, ações, títulos; comprar bens valiosos como artes e joias; transferir dinheiro eletronicamente para contas bancárias offshore de empresas de fachada com ações ao portador; realizar negociações complexas com ações e commodities); (iii) A reintegração (também chamada reciclagem ou integração) é a fase final do processo de lavagem de dinheiro, através dos recursos “lavados” sendo reintroduzidos na economia legítima parecendo ter origem de fonte legítima. Após essa fase torna-se muito difícil distinguir entre recursos legais e ilegais.

3.   E o mercado de artes?

Algumas características do mercado de artes o torna vulnerável para a lavagem de dinheiro e o financiamento de atividades ilegais, dentre elas: bens de alto valor, mercado e redes internacionais, uso rotineiro de intermediários ou procuradores em transações, uso rotineiro de contas e estruturas internacionais e offshores, cultura da discrição, comprador e vendedor muitas vezes desconhecidos entre si.

A compra de obra de arte pode legitimar recursos com a conversão de ativo que se valoriza e pode ser vendido posteriormente.

O mercado de artes é um ambiente propício para atividades ilícitas. Empresas do mercado de arte podem envolver-se involuntariamente em esquemas e técnicas de lavagem de dinheiro, financiamento de terrorismo ou tráfico ilícito. As penalidades são severas, dentre elas, responsabilidade criminal (com multas e prisão), danos à reputação, restrições à atividade do mercado (podendo perder suas licenças de operação), etc.

Aqui estão algumas recomendações essenciais para combater a lavagem de dinheiro e o financiamento terrorista no mercado de artes:

  • Transparência nas Transações: 

Estabelecer um sistema transparente de registro de transações de obras de arte, incluindo informações detalhadas sobre compradores, vendedores e intermediários. Isso ajuda a rastrear a origem e o destino dos fundos envolvidos.

  • Due Diligence Aprimorada:

Exigir que galerias, leiloeiros e outras entidades do mercado de artes realizem uma due diligence rigorosa ao verificar a identidade dos compradores e vendedores. Isso inclui a verificação de fontes de fundos e a identificação de pessoas politicamente expostas.

  • Colaboração Internacional:

Promover a cooperação entre países para trocar informações sobre transações suspeitas e práticas fraudulentas. Acordos bilaterais e multilaterais podem fortalecer a capacidade de investigação e aplicação da lei em escala global.

  • Educação e Conscientização:

Investir em programas educacionais para sensibilizar galerias, colecionadores e profissionais do mercado de artes sobre os riscos associados à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. O conhecimento é uma ferramenta poderosa na prevenção dessas atividades ilícitas.

  • Regulação e Fiscalização:

Estabelecer órgãos reguladores especializados para supervisionar o mercado de artes, implementar políticas anti-lavagem de dinheiro e conduzir investigações quando necessário. A fiscalização eficaz é fundamental para dissuadir atividades criminosas.

  • Uso de Tecnologia:

Explorar tecnologias inovadoras, como blockchain, para criar registros imutáveis de transações de arte. Isso pode aumentar a transparência e a confiabilidade das informações, dificultando a manipulação de dados.

  • Penalidades Dissuasivas:

Impondo penalidades severas para indivíduos e entidades que violam as leis anti-lavagem de dinheiro e contra o financiamento do terrorismo. Sanções significativas são essenciais para dissuadir atividades ilegais no mercado de artes.

  • Monitoramento Contínuo:

Estabelecer um sistema robusto de monitoramento contínuo das transações e padrões de comportamento no mercado de artes. Isso permite a detecção precoce de atividades suspeitas e a resposta rápida por parte das autoridades competentes.

Ao adotar essas diretrizes e promover uma cultura de conformidade e transparência, o mercado de artes pode ser protegido contra atividades ilícitas, preservando assim a integridade do setor e garantindo que ele continue a prosperar de maneira ética e legal.


4.   A legislação brasileira: Lei Federal Brasileira 9613/98 e Lei 12.683/12

A Lei 9613/98 dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos na Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, e dá outras providências. Esta lei remonta ao ano de 1988 quando a ONU promoveu a Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, conhecida como Convenção de Viena, ratificada pelo Brasil em 1991.

No artigo primeiro tipifica o crime de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores:

     Art. 1º. Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

     I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
     II - de terrorismo;
     III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à sua produção;
     IV - de extorsão mediante seqüestro;
     V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
     VI - contra o sistema financeiro nacional;
     VII - praticado por organização criminosa.

     Pena: reclusão de três a dez anos e multa.

     §1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo:

     I - os converte em ativos lícitos;
     II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;
     III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros.

     § 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:

     I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores que sabe serem provenientes de qualquer dos crimes antecedentes referidos neste artigo;
     II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.


     § 4º A pena será aumentada de um a dois terços, nos casos previstos nos incisos I a VI do caput deste artigo, se o crime for cometido de forma habitual ou por intermédio de organização criminosa.

No artigo sétimo institui os efeitos da condenação:

     Art. 7º. São efeitos da condenação, além dos previstos no Código Penal:

     I - a perda, em favor da União, dos bens, direitos e valores objeto de crime previsto nesta Lei, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;
     II - a interdição do exercício de cargo ou função pública de qualquer natureza e de diretor, de membro de conselho de administração ou de gerência das pessoas jurídicas referidas no art. 9º, pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada.

No artigo nono estabelece as pessoas sujeitas à lei, especificando no parágrafo único alínea XI as pessoas fisícas e jurídicas que operam no mercado de arte:

     Art. 9º. Sujeitam-se às obrigações referidas nos arts. 10 e 11 as pessoas jurídicas que tenham, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não:

     I - a captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira;
     II - a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro como ativo financeiro ou instrumento cambial;
     III - a custódia, emissão, distribuição, liqüidação, negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários.

     Parágrafo único. Sujeitam-se às mesmas obrigações:

     I - as bolsas de valores e bolsas de mercadorias ou futuros;
     II - as seguradoras, as corretoras de seguros e as entidades de previdência complementar ou de capitalização;
     III - as administradoras de cartões de credenciamento ou cartões de crédito, bem como as administradoras de consórcios para aquisição de bens ou serviços;
     IV - as administradoras ou empresas que se utilizem de cartão ou qualquer outro meio eletrônico, magnético ou equivalente, que permita a transferência de fundos;
     V - as empresas de arrendamento mercantil (leasing) e as de fomento comercial (factoring);
     VI - as sociedades que efetuem distribuição de dinheiro ou quaisquer bens móveis, imóveis, mercadorias, serviços, ou, ainda, concedam descontos na sua aquisição, mediante sorteio ou método assemelhado;
     VII - as filiais ou representações de entes estrangeiros que exerçam no Brasil qualquer das atividades listadas neste artigo, ainda que de forma eventual;
     VIII - as demais entidades cujo funcionamento dependa de autorização de órgão regulador dos mercados financeiro, de câmbio, de capitais e de seguros;
     IX - as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, que operem no Brasil como agentes, dirigentes, procuradoras, comissionárias ou por qualquer forma representem interesses de ente estrangeiro que exerça qualquer das atividades referidas neste artigo;
     X - as pessoas jurídicas que exerçam atividades de promoção imobiliária ou compra e venda de imóveis;
     XI - as pessoas físicas ou jurídicas que comercializem jóias, pedras e metais preciosos, objetos de arte e antigüidades.

No artigo 14 cria o Conselho de controle de atividades financeiras (COAF) que tem competência para emitir instruções para o mercado de arte tendo em vista não haver órgão fiscalizador ou regulador específico, incluindo a definição das pessoas abrangidas e a aplicação das sanções previstas em lei:

     Art. 14. É criado, no âmbito do Ministério da Fazenda, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - COAF, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas previstas nesta Lei, sem prejuízo da competência de outros órgãos e entidades.

     § 1º As instruções referidas no art. 10 destinadas às pessoas mencionadas no art. 9º, para as quais não exista órgão próprio fiscalizador ou regulador, serão expedidas pelo COAF, competindo-lhe, para esses casos, a definição das pessoas abrangidas e a aplicação das sanções enumeradas no art. 12.

     § 2º O COAF deverá, ainda, coordenar e propor mecanismos de cooperação e de troca de informações que viabilizem ações rápidas e eficientes no combate à ocultação ou dissimulação de bens, direitos e valores.

     Art. 15. O COAF comunicará às autoridades competentes para a instauração dos procedimentos cabíveis, quando concluir pela existência de crimes previstos nesta Lei, de fundados indícios de sua prática, ou de qualquer outro ilícito.

A Lei 12.683/12 alterou a lei 9613/98 no que diz respeito aos crimes antecedentes que originam a lavagem, substituindo a palavra “crime” pela expressão “infração penal” e elimina o rol taxativo de crimes antecedentes, o que amplifica a abrangência da lei para acompanhar novas práticas criadas para ocultar lucros obtidos de modo ilícito e também permite que qualquer conduta possa originar crime de lavagem de dinheiro. Também houve alteração no artigo 9 sobre o rol de pessoas submetidas aos instrumentos de controle passando a estar aquelas que “em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não”. Assim, passaram a estar incluídos atividades de promoção, intermediação, comercialização, agenciamento ou negociação de direitos de transferência de atletas, artistas ou feiras, exposições ou outros eventos similares, além de assessoria, consultoria, contadoria, auditoria, aconselhamento ou assistência, de qualquer natureza em ações de compra e venda de imóveis, gestão de fundos, abertura de contas bancárias, entre outros. Com essa lei também foi aumentada a lista de obrigações expandido-se a obrigação de manter registros e cadastro de clientes e transações para a obrigatoriedade de cadastrar-se no órgão regulador ou fiscalizador, e na falta deste, no COAF, atender às requisições formuladas pelo COAF na periodicidade, forma e condições por ele estabelecidas, além de ter que comunicar ao COAF, em total sigilo e no prazo de 24 horas, a proposta ou realização de transações monetárias ou de bens que ultrapassarem o limite fixado pela autoridade competente ou que contiverem “sérios indícios” de lavagem de dinheiro.



DIRETRIZ 1 – AVALIE O RISCO DO SEU NEGÓCIO E IMPLEMENTE MEDIDAS DE SEGURANÇA

A avaliação do risco de lavagem de dinheiro e financiamento de atividades ilícitas inclui as seguintes áreas de investigação: quais tipos de transação o negócio realiza, quais informações dos clientes são coletadas e registradas, qual procedimento de due diligence é realizada nas obras de arte, que controle existe sobre pagamento em dinheiro e origem dos recursos, qual consciência de risco existe entre os funcionários e que treinamento é realizado, quais processos e procedimentos são revisados e qual a periodicidade são realizadas melhorias nos processos.

DIRETRIZ 2 – CONHEÇA E CUMPRA AS LEIS ONDE FAZ NEGÓCIOS E ESTEJA ALERTA AOS SINAIS DE RISCO

Não existe um regime jurídico único, harmonizado e global e portanto as empresas do mercado de arte devem estar atualizadas e cumprir os requisitos legais que se aplicam a suas atividades nos países que operam. Ao realizar a correta diligência, as empresas do mercado de arte devem estar alertas a indicadores de atividades suspeitas (sinais de alerta do cliente, das obras de arte e da transação). Particular atenção deve ser tomada no Brasil para a Lei Federal 9613/98 de 3 de março de 1998. Esta lei estabelece responsabilidade administrativa e sanções em seu artigo 12:

     Art. 12. Às pessoas referidas no art. 9º, bem como aos administradores das pessoas jurídicas, que deixem de cumprir as obrigações previstas nos arts.10 e 11 serão aplicadas, cumulativamente ou não, pelas autoridades competentes, as seguintes sanções:

     I - advertência;
     II - multa pecuniária variável, de um por cento até o dobro do valor da operação, ou até duzentos por cento do lucro obtido ou que presumivelmente seria obtido pela realização da operação, ou, ainda, multa de até R$200.000,00 (duzentos mil reais);
     III - inabilitação temporária, pelo prazo de até dez anos, para o exercício do cargo de administrador das pessoas jurídicas referidas no art. 9º;
     IV - cassação da autorização para operação ou funcionamento.

     § 1º A pena de advertência será aplicada por irregularidade no cumprimento das instruções referidas nos incisos I e II do art. 10.

     § 2º A multa será aplicada sempre que as pessoas referidas no art. 9º, por negligência ou dolo:

     I - deixarem de sanar as irregularidades objeto de advertência, no prazo assinalado pela autoridade competente;
     II - não realizarem a identificação ou o registro previstos nos incisos I e II do art. 10;
     III - deixarem de atender, no prazo, a requisição formulada nos termos do inciso III do art. 10;
     IV - descumprirem a vedação ou deixarem de fazer a comunicação a que se refere o art. 11.

     § 3º A inabilitação temporária será aplicada quando forem verificadas infrações graves quanto ao cumprimento das obrigações constantes desta Lei ou quando ocorrer reincidência específica, devidamente caracterizada em transgressões anteriormente punidas com multa.

     § 4º A cassação da autorização será aplicada nos casos de reincidência específica de infrações anteriormente punidas com a pena prevista no inciso III do caput deste artigo.


DIRETRIZ 3 – CONHEÇA SEUS CLIENTES E ESTABELEÇA SEUS PERFIS DE RISCO

Verifique se há sinais de alerta dos clientes, intermediários ou procuradores. A empresa deve compreender o propósito, a natureza pretendida da transação e a fonte de riqueza do cliente (como ganham dinheiro e qual origem da coleção de arte) estabelecendo assim o perfil de risco do cliente e o nível de monitoramento contínuo adequado. Se o cliente for uma entidade corporativa há necessidade de identificar os controladores. As empresas do mercado de arte devem fazer esforços para garantir que conduzem negócios apenas com clientes que tenham certeza razoável de que estão envolvidos em negócios legítimos, garantindo que os fundos utilizados nas transações são fornecidos pelo comprador ou por terceiro com transação legítima. A identificação dos clientes deve ocorrer através de documentos oficiais verificáveis (RG, passaporte, contrato social, validação de atos de diretoria, etc.) e prova de endereço, mantendo cópia desses documentos pelo período estabelecido pela legislação local. Se houver intermediário operando na transação a empresa deverá olvidar esforços para estabelecer a identidade do proprietário efetivo e a natureza jurídica da representação do cliente contratante em relação ao proprietário efetivo. As empresas do mercado de arte também poderão optar por incluir garantias e representações adequadas nos acordos comerciais. Exemplos de sinais de alerta incluem quando o cliente é pessoa exposta politicamente (PEP), empresa offshore, ou residente de um país na lista de vigilância do GAFI, podendo fazer pesquisas nas listas de PEPs, listas de vigilância periodicamente emitidas por organizações governamentais e internacionais, bem como pesquisas na mídia dos nomes dos clientes, beneficiários, intermediários e outras palavras chave. Se houver sinais de alerta as pesquisas devem ser aprofundadas. As empresas do mercado de arte devem manter registro por tempo adequado de todos os documentos e dados analisados.


DIRETRIZ 4 – PESQUISE A OBRA DE ARTE, SUA PROPRIEDADE E PROCEDÊNCIA

Uma proveniência indiscutível e ininterrupta além de uma autenticidade comprovada da obra de arte são os objetivos em todas as transações, porém isso pode não ser possível. Nesse sentido é importante obter e publicar no catálogo e documento de venda o máximo de informações possível sobre a obra de arte, incluindo a procedência conhecida 3. Além disso, a empresa do mercado de arte deve verificar as principais bases de dados de arte roubada e saqueada e obter documentos legais relevantes e disponíveis, declarações de testemunhas, e pareceres de peritos (se for o caso). Na ausência de objeções válidas, é razoável supor que o possuidor de uma obra de arte goza de propriedade total, mas a posse em si não é garantia de propriedade ou de direitos disponíveis. É aconselhável que a empresa solicite ao vendedor documentos que comprovem a propriedade, ou caso não o seja, que identifique o verdadeiro proprietário. A empresa também buscará ter razoável certeza de que a história conhecida dos proprietários anteriores da obra de arte foi estabelecida na medida do possível. No caso de antiguidades, as empresas de arte precisam ter certeza que os objetos não foram recentemente escavados ou saqueados do país de origem. Os documentos que podem ser úteis para estabelecer a propriedade e a procedência incluem faturas, recibos, fotografias datadas, registros de seguros, avaliações, registros oficiais, catálogos de exposições, faturas de trabalhos de restauro, agendas, jornais datados, artigos, cartas originais assinadas e datadas. Além de ajudar nas verificações de prevenção à lavagem de dinheiro, as informações de procedência e propriedade, combinadas a exames físicos e científicos da obra de arte, análise técnica e datação dos materiais utilizados, desempenham papel importante para ajudar a estabelecer a autenticidade da obra de arte.


DIRETRIZ 5 – CONHEÇA O HISTÓRICO E A FINALIDADE DA TRANSAÇÃO

As empresas devem examinar o objetivo, a forma e a estrutura da transação, a origem dos recursos bem como os antecedentes e o propósito do cliente que envolve a transação. Por exemplo, as obras de arte vendidas pelo cliente são consistentes com a coleção conhecida do cliente? O nível que o cliente está transacionando são compatíveis com seu histórico, atividades profissionais e patrimônio pessoal? Caso as respostas sejam negativas, a empresa deve questionar e pedir mais informações ao cliente. As empresas também devem considerar a forma de transação, se ocorreu por intermediários, pessoalmente, por internet, por telefone ou outro meio similar não presencial, pois dependendo da natureza e localização geográfica há necessidade de um aprofundamento da pesquisa do cliente e da transação. Pagamentos em espécie (dinheiro) devem ser desencorajados pois a origem dos recursos não poderá ser rastreada, impossibilitando a análise da origem ser lícita e limpa. As empresas devem atentar-se aos limites permitidos de transações em dinheiro em sua geografia (na União Europeia o limite é de 10.000 euros por transação). As empresas do mercado de arte são incentivadas a recusar pagamentos de terceiros não clientes ou de compradores não registrados. Também devem dar preferência a transações com pagamento com bancos respeitáveis em jurisdições sujeitas a regulamentações internacionais. O grupo de Ação Financeira (GAFI) publica a lista de jurisdições de alto risco e não cooperativas que devem ser evitados. As empresas do mercado de arte são aconselhadas a ter cuidado e evitar pagamentos em moedas digitais que não sejam controladas ou regulamentadas. Qualquer atividade relacionada a uma transação contemplada que não seja consistente com o perfil do cliente, seu histórico e perfil de risco ou outra forma que gere sinais de alerta deve gerar diligência e aprofundamento de análise adequada.


DIRETRIZ 6 – MANTENHA REGISTROS

As empresas do mercado de arte devem manter registros das verificações de diligência que realizaram de preferência com sistemas implementados para registrar e armazenar documentações e informações recolhidas no processo. Manter registro datado da relação aos seus clientes, às obras de arte e às transações realizadas permite: (i) avaliar riscos de clientes e transações realizadas; (ii) cumprir obrigações legais; (iii) identificar sinais de alertas relacionados a clientes, obras de arte e transações; (iv) determinar se existem suspeitas suficientes para justificar a recusa da transação e, quando apropriado, comunicar aos órgãos responsáveis pela aplicação da lei; (v) rever e melhorar seus procedimentos referentes à prevenção à lavagem de dinheiro; (vi) cumprir obrigações legais de responder pedidos de informação e assistência aos órgãos competentes. Todos documentos emitidos por uma empresa do mercado de arte relativos a uma transação (avaliações, contratos de compra e venda, faturas, documentos de envio, declarações de importação/exportação, etc.) devem ser verdadeiros, precisos e contemporâneos, representando opinião de profissionais diligentes e honestos. As empresas devem recusar pedidos de clientes para alterar, retroagir, falsificar ou fornecer documentação ou informações incompletas ou enganosas relacionadas a qualquer atividade, incluindo qualquer transação. Se existirem razões legitimas para alterar um documento, as circunstâncias e justificativas devem ser totalmente documentadas e arquivadas para futura referência e auditoria. As empresas devem manter seus registros durante o período legalmente exigido ou quando não existir exigência legal utilizar as práticas padrão da jurisdição que operam (o período normalmente varia entre 5 e 10 anos a partir da conclusão da transação ou do término do relacionamento comercial).

No Brasil o artigo 10 da Lei 9613/98 estabelece a obrigatoriedade da identificação dos clientes e manutenção de registros:

     Art. 10. As pessoas referidas no art. 9º:

     I - identificarão seus clientes e manterão cadastro atualizado, nos termos de instruções emanadas das autoridades competentes;
     II - manterão registro de toda transação em moeda nacional ou estrangeira, títulos e valores mobiliários, títulos de crédito, metais, ou qualquer ativo passível de ser convertido em dinheiro, que ultrapassar limite fixado pela autoridade competente e nos termos de instruções por esta expedidas;
     III - deverão atender, no prazo fixado pelo órgão judicial competente, as requisições formuladas pelo Conselho criado pelo art. 14, que se processarão em segredo de justiça.

     § 1º Na hipótese de o cliente constituir-se em pessoa jurídica, a identificação referida no inciso I deste artigo deverá abranger as pessoas físicas autorizadas a representá-la, bem como seus proprietários.

     § 2º Os cadastros e registros referidos nos incisos I e II deste artigo deverão ser conservados durante o período mínimo de cinco anos a partir do encerramento da conta ou da conclusão da transação, prazo este que poderá ser ampliado pela autoridade competente.


DIRETRIZ 7 – TREINAR PESSOAL E MONITORAR PROCESSOS E PROCEDIMENTOS

Os funcionários e colaboradores devem receber treinamento regular sobre riscos de lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo para que tenha clareza sobre suas funções e responsabilidade na prevenção, detecção e denúncia de suspeitas. Eles devem saber a quem se reportar internamente e a(s) pessoa(as) designada(s) para receber as denúncias devem saber como lidar com a questão e quando denunciar às autoridades competentes. Os treinamentos devem ter início preferencialmente logo após a contratação e ter atualizações para garantir que o pessoal permaneça consciente sobre novos riscos ou alterações do perfil de risco do negócio.


DIRETRIZ 8 – HAVENDO SUSPEITAS FUNDAMENTADAS, SABER COMO AGIR

Quando as circunstâncias de uma transação derem origem a suspeitas fundamentadas de lavagem de dinheiro ou financiamento de terrorismo e na ausência de uma explicação plausível ou de documentação adicional que elucide as suspeitas, as empresas do mercado de arte devem considerar abster-se de celebrar ou concluir a transação, e/ou relatar as suspeitas às autoridades competentes na jurisdição onde exista a obrigação de reportar.

O artigo 11 da Lei Brasileira 9613 estabelece critérios para comunicação de transações suspeitas:

     Art. 11. As pessoas referidas no art. 9º:

     I - dispensarão especial atenção às operações que, nos termos de instruções emanadas das autoridades competentes, possam constituir-se em sérios indícios dos crimes previstos nesta Lei, ou com eles relacionar-se;
     II - deverão comunicar, abstendo-se de dar aos clientes ciência de tal ato, no prazo de vinte e quatro horas, às autoridades competentes:

a) todas as transações constantes do inciso II do art. 10 que ultrapassarem limite fixado, para esse fim, pela mesma autoridade e na forma e condições por ela estabelecidas;

b) a proposta ou a realização de transação prevista no inciso I deste artigo.

     § 1º As autoridades competentes, nas instruções referidas no inciso I deste artigo, elaborarão relação de operações que, por suas características, no que se refere às partes envolvidas, valores, forma de realização, instrumentos utilizados, ou pela falta de fundamento econômico ou legal, possam configurar a hipótese nele prevista.

     § 2º As comunicações de boa-fé, feitas na forma prevista neste artigo, não acarretarão responsabilidade civil ou administrativa.

     § 3º As pessoas para as quais não exista órgão próprio fiscalizador ou regulador farão as comunicações mencionadas neste artigo ao Conselho de Controle das Atividades Financeiras - COAF e na forma por ele estabelecida.


DIRETRIZ 9 – MANTENHA UMA POLÍTICA CLARA DE COMPLIANCE E CONFORMIDADE

Os programas e políticas de compliance são instrumentos importantes e necessários nas atividades empresariais, e uma política de compliance visando a prevenção de lavagem de dinheiro deve contemplar treinamentos internos sobre a questão, construção de canais de denúncia internos, elaboração de padrões de monitoramento de procedimentos internos e transações, definição de procedimento padrão e adequado em caso de suspeita de lavagem de dinheiro e definição de punições internas administrativas adequadas.


1 Este material é baseado no guia da organização RAM – responsible art market, www.responsibleartmarket.org e nas leis brasileiras 9613/98 e 12683/12 que dispõem sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores.

2 A lavagem de dinheiro e financiamento de terrorismo são preocupações internacionais. Ameaçam a integridade do sistema financeiro internacional e dos seus mercados. O Grupo de Ação Financeira (GAFI), organismo intergovernamental, criado em 1989, estabelece normas e promove a implementação de medidas legais, regulamentares e operacionais para combater a lavagem de dinheiro, o financiamento do terrorismo e outras ameaças para o sistema financeiro internacional.

3 Normalmente essas informações incluem nome do artista ou realizador, título da obra, procedência conhecida, número de partes/peças, presença de assinatura, data e/ou outra inscrição, data de criação, país de criação, dimensões, materiais e técnica (ex. óleo sobre tela, aquarela, escultura em bronze, técnica mista, vídeo instalação, etc.).

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